Traço Negro
Traço Negro é um sopro na poeira que cobre rostos negros no tempo, é uma dança das águas que frescas avivam lembranças, é galho viçoso que rompe a terra para tornar-se caule robusto, é folha que joga no ar notícias de antes pra o amanhã nascer, é labareda de vida, que insiste e se renova, se alimenta do vento e gera alimento para ori. Traço Negro está aqui para dizer de potência de vida, de geração de mundos, de transformação de imaginários, de invenção de realidades. Nos sabemos negres e sabemos de nossas histórias, o passado conversa com nossa pele, emaranha nossos cabelos e nos lança para as encruzilhadas, estas cheias de possibilidades, de distintos caminhos prenhes de novas narrativas, de outras imagens e de múltiplas existências.
Traço Negro é uma pesquisa iniciada em 2014 por Tina Melo no Mestrado Profissional em História da África, Diáspora e dos Povos Indígenas (concluído em 2016) na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia em Cachoeira, que visa refletir sobre a invisibilização de artistas visuais negres em Cachoeira e São Félix, apresentando possibilidades de afirmação dessas histórias de vida e de produção.
A partir do diálogo entre os referenciais teóricos, e as visitas e conversas nos ateliês e residências de cada artista, foi possível desenvolver um material que afirma essas colaborações para o desenvolvimento das linguagens artísticas visuais na Bahia, como alternativa ao apagamento histórico .
Assim, apresentamos um livro virtual, um documentário e uma exposição resultantes da pesquisa que mergulha na trajetória dessus artistes,e que conversa com as potências criativas e de reinvenção de realidades propostas nessas estéticas e histórias. No livro, a linguagem poética flui numa abordagem de inspiração biográfica, sem pretensões descritivas, que constrói imagens de vida e trabalho, em narrativas espiralares. No documentário, a voz em primeira pessoa apresenta traços, caminhos e memórias dessus artistes, suas inspirações, anseios, motivações e percepções do território, do fazer artístico, da vida e do olhar para o mundo. A exposição apresenta um pequeno recorte dessa vasta produção, que buca mais do que criar um recorte ou tipificação de estilo, mas sim apresentar a diversidade e complexidade de formas e ideias propostas por cada artista, em suas variadas linguagens.
Aletícia Bertosa, Áydano Jr., Billy Oliveira, Biro, Daniel Araújo, Deisiane Barbosa, Florisvaldo Ribeiro (Flor do Barro), Carlos Alberto do Nascimento (Fory), Gilberto Filho, Renato Kiguera, Celestino Gama (Louco Filho), Almir Oliveira ( Mimo) e seu filho Ronald Oliveira, Eraldo Souza Jr. (Pirulito), Rita de Cássia, Jonilson Rodrigues(Sininho) e Tina Melo, artistas que correm junto com o rio grande, o Paraguaçu, de águas negras, as vezes calmas, mas sempre ancestrais. Artistas de Traço Negro, que levam no olhar, no toque, na voz e no corpo, a memória viva de antepassados atlânticos.
Todo o material foi desenvolvido a partir de encontros, conversas, diálogos e trocas com us artistes, processo intenso e fecundo, que alimenta a alma, o imaginário e as ideias. Mas como o percurso da vida é construído de doçuras e agruras, em 2017 J. Cardoso, o Doidão, fez sua passagem para o plano ancestral, o grande escultor cachoeirano deixou um imenso legado, constribuição inquestionável para a produção escultórica da Bahia e do Brasil. Hoje uma lembrança alegre, um nome a ser guardado e ao qual rendemos homenagem, uma existência que permanece pulsante em cada lábio, filá de orixá, dente de carranca ou cavalo de São Jorge entalhados por suas mãos em madeira antiga, curtida pelo sol e pela chuva, que sussura seu nome.
Para lançamento do livro, do documentário e da exposição realizaremos um evento virtual marcado pela participação dus artistes em um bate papo, e a exibição do filme, a fim de ampliar o alcance de público e acesso ao material produzido, divulgado nas redes sociais do projeto e disponibilizado no site. A exposição e o livro permanecerão disponíveis para acesso e download por tempo indeterminado.